domingo, 8 de janeiro de 2012

Querer

Não te quero senão porque te quero
E de querer-te a não querer-te chego
E de esperar-te quando não te espero
Passa meu coração do frio ao fogo.
Te quero só porque a ti te quero,
Te odeio sem fim, e odiando-te rogo,
E a medida de meu amor viageiro
É não ver-te e amar-te como um cego.
Talvez consumirá a luz de janeiro
Seu raio cruel, meu coração inteiro,
Roubando-me a chave do sossego.
Nesta história só eu morro
E morrerei de amor porque te quero,
Porque te quero, amor, a sangue e a fogo.



Pablo Neruda

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Dois Gumes

Tuas palavras são lâminas
Tua língua é uma espada afiada
Tiras tuas injúrias de tua bainha
E me traspassas, ferindo-me duplamente
Ao passo que me fazes inúmeros cortes profundos
E não te dás que me deixas assim, desfigurada e sangrando

És frio, não te arrependes
Não sentes peso algum em tua alma
Não te dás que matas a minha
E não te dás que me fazes padecer



sexta-feira, 1 de abril de 2011

Impiedoso

O tempo corre.
Não tenho tempo para fazer o que quero. Não tenho diversão, só muitas obrigações e o tempo é pouco para cumpri-las todas.
Compro livros, mas não tenho tempo para lê-los.
Tenho a guitarra que queria, mas não tenho tempo para tocá-la.
Tenho uma família, mas eu não passo tanto tempo com ela quanto gostaria.
Não tenho tempo para ouvir as músicas que gosto.
Não tenho tempo para pensar o que quero.
Tenho alguns pretendentes, mas nenhum namorado. Namorado toma muito tempo.
Tenho amigos, mas não tenho tempo para eles. Aliás, meus amigos mudam, mas eu não tenho tempo para acompanhar as mudanças. Acabo virando uma estranha.
Meus amigos têm novos amigos. Eu não tenho tempo para os meus amigos e eles não têm tempo para mim.
Não moro na minha casa, eu apenas passo as noites e os fins de semana aqui. Eu não saio aos fins de semana, em vez disso eu estudo.
Eu estudo muito, mas não sei de tudo sobre nada. Meus conhecimentos são fragmentados e eu não posso mudar isso.
Tive uma adolescência, mas aproveitei muito pouco. Fiquei presa na redoma da minha timidez observando os outros, enquanto isso o tempo correu.
Aliás, eu ainda sou adolescente. No entanto, não tenho tempo para ser adolescente. O tempo corre, preciso ser adulta logo.
Eu preciso utilizar o meu tempo enchendo minha mente com coisas que me proporcionarão um bom emprego. Eu preciso de estabilidade, segurança, status. Eu preciso ser independente.
Preciso acompanhar as coisas que acontecem ao longo do tempo, do pouco tempo que estou aqui. Mas não tenho tempo para isso.
Preciso trabalhar, preciso fazer coisas, preciso saber coisas, preciso...
O tempo corre. Eu preciso acompanhá-lo e estou presa à ele.
O tempo é uma corda curta demais até para me enforcar.